Porque é que o mundo precisa de amigos verdadeiros numa era de solidão digital e hiperconectividade
SAÚDE & BEM-ESTAR
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Porque é que o mundo precisa de amigos verdadeiros numa era de solidão digital e hiperconectividadeApesar dos milhares de milhões de ligações digitais, a solidão está a aumentar. No Dia Internacional da Amizade, um psicólogo clínico lembra-nos que nenhum número de gostos pode substituir o abraço de um verdadeiro amigo.
Dia da Amizade / Getty Images
há 7 horas

Neste Dia Internacional da Amizade, celebrado em todo o mundo a 30 de julho, as pessoas publicam mensagens sentidas, marcam amigos e partilham fotografias nostálgicas.

Trata-se de um dia oficialmente reconhecido pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 2011, cujas raízes remontam a 1958, quando a Cruzada Mundial da Amizade propôs um dia dedicado à celebração do valor da amizade.

Este dia encoraja as pessoas de todo o mundo a estimar os seus amigos, a expressar o seu apreço e a reforçar os laços que nos unem. Mas no mundo atual de hiperconectividade e para além dos gestos digitais, há uma questão mais profunda: Estaremos verdadeiramente mais ligados ou mais solitários do que nunca?

Apesar da deslumbrante variedade de plataformas de redes sociais, aplicações de mensagens e videochamadas que revolucionaram a forma como interagimos, os especialistas alertam para o facto de podermos estar a confundir ligação com comunhão.

"Os seres humanos são criaturas sociais. Precisam de interação cara a cara, de olhar nos olhos uns dos outros, de se tocarem, de estarem fisicamente presentes", diz Fazilet Seyitoglu, psicólogo clínico, à TRT World.

Seyitoglu passou mais de uma década a investigar o impacto psicológico do envolvimento digital e escreveu livros sobre o bem-estar emocional. Ela comenta os diferentes modos de socialização e o seu impacto nas pessoas.

"As pessoas parecem sociais; estão a interagir no Facebook, Twitter, Instagram. Mas não é esse o tipo de interação que preenche a alma", diz ela. "Quando nos dói o coração ou precisamos de alguém que se sente ao nosso lado em silêncio, nenhuma aplicação pode proporcionar esse tipo de companhia."

Paradoxo de uma era conectada

Com quase 5 mil milhões de pessoas em linha e mais de 2,5 mil milhões a utilizarem diariamente as redes sociais, a humanidade está mais ligada digitalmente do que nunca. Mas os estudos mostram repetidamente um aumento na solidão relatada, especialmente entre os jovens adultos.

Num estudo de 2022, conduzido pelo psicólogo Eric J Moody, os estudantes universitários que participavam frequentemente em conversas cara a cara relataram níveis mais baixos de solidão social e emocional. Em contraste, os utilizadores de Internet com elevada frequência sentiram menos solidão social, mas mais solidão emocional - um vazio que nenhuma quantidade de scroll poderia corrigir.

Seyitoglu chama a atenção para este paradoxo.

"O mundo digital move-se rapidamente. As pessoas procuram o prazer, a validação e a gratificação instantânea. É um espaço movido pelo ego e não pela empatia. É por isso que estamos a assistir a uma erosão das amizades reais e recíprocas", afirma.

O problema, acrescenta Seyitoglu, é mais profundo do que o tempo de ecrã. "Estamos a perder algo sagrado, os valores das sociedades orientais que davam ênfase à comunidade, à família e às relações duradouras. Hoje, o que importa é o eu. Prazer instantâneo. Viver sozinho. E a alma humana está a morrer de fome", afirma.

A autora pinta um quadro vívido para elucidar dois cenários em que os amigos do ecrã não vencem necessariamente os da vida real, especialmente durante as crises. As razões, acrescenta, podem ser variadas para estes comportamentos.

"Em tempos de crise, o seu amigo do Facebook não pode ir à sua porta. Ele vive do outro lado do mundo. Por mais gostos que recebamos, não se compara a alguém que nos dá a mão quando choramos."

A sua preocupação não é apenas filosófica. Estudos efectuados por Engelberg e Sjöberg (2004) associaram uma elevada utilização da Internet a uma menor adaptação social e inteligência emocional.

Um estudo de 2014 realizado por Yao e Zhong concluiu que a dependência da Internet pode, de facto, causar solidão e não curá-la.

Um apelo para nos redescobrirmos uns aos outros

Então, o que fazer num mundo saturado de ruído digital e de interações superficiais?

"A verdadeira amizade pode começar online", diz Seyitoglu, "mas tem de crescer no mundo real. A verdadeira amizade implica sacrifício, tempo e presença física. Sem isso, corremos o risco de nos tornarmos estranhos, mesmo para nós próprios".

Numa sociedade em que até os idosos se voltam para os ecrãs em busca de companhia, Seyitoglu apela a um regresso ao básico: refeições partilhadas, conversas reais, visitas espontâneas.

Numa altura em que os níveis globais de solidão aumentam, sendo agora reconhecida por alguns governos como uma crise de saúde pública, as palavras de Seyitoglu tocam o coração.

"O toque é humano. O contacto visual é curativo. Temos de nos lembrar que ser visto não é o mesmo que ser conhecido", acrescenta.

Num mundo de histórias com curadoria e filtros, talvez a coisa mais radical que possamos fazer seja aparecer - sem filtros - uns para os outros.

Por isso, ao passar hoje pelos tributos à amizade, considere a hipótese de fechar o ecrã e ligar a alguém - ou, melhor ainda, de se encontrar pessoalmente com essa pessoa. Porque embora o mundo digital possa prometer uma ligação, é na presença física do outro que encontramos a verdadeira pertença.

E neste Dia Internacional da Amizade, ela oferece uma mensagem discreta mas urgente: "Cada segundo que investimos mais na vida digital, roubamos à nossa vida social. E, eventualmente, sentiremos essa pobreza, não nos nossos feeds, mas nos nossos corações."

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