ISTAMBUL – Estamos agora a poucos dias do Dhul Hijjah, o último mês do calendário lunar islâmico, que abrange dez dos dias mais sagrados para os muçulmanos em todo o mundo. Mais de um milhão de peregrinos já chegaram à Arábia Saudita para o Hajj, a peregrinação única na vida à cidade sagrada de Meca. Este ano, Al’hamdulillah (louvado seja Deus), serei um deles.
Com quase 33 anos – uma idade significativa na tradição islâmica, considerada a idade das pessoas no Paraíso –, encontro-me em Istambul a fazer as malas com uma torrente de emoções. É considerada uma idade relativamente jovem para esta viagem, já que muitos muçulmanos esperam até mais tarde na vida. Sinto-me honrado, grato e, para ser sincero, um pouco assoberbado.
Há uma emoção silenciosa em saber que estarei caminhando ao lado de muçulmanos de todos os cantos do mundo. Vamos rezar juntos, ombro a ombro, independentemente da língua e da cultura, unidos em nosso amor por Deus. Mas também há ansiedade. Será que vou fazer jus a uma jornada tão sagrada?
O Hajj não é apenas um ritual. É uma transformação.
Isso lembra-nos do nosso propósito mais profundo: por que estamos aqui e para onde estamos a regressar. É algo profundamente pessoal, mas totalmente coletivo. De certa forma, é um convite de Deus para lembrarmos que nunca fomos destinados a percorrer esta vida sozinhos.
A cada passo — físico, espiritual e emocional —, o Hajj ensina-nos que somos seres completos, destinados a adorar não apenas com os nossos corações, mas também com os nossos corpos e em comunidade.
Na preparação para a minha partida, tentei preparar-me em várias etapas: estudando a logística de cada ritual, refletindo sobre os seus significados e contemplando o profundo simbolismo incorporado neles. Como alguém que já se orgulhou de ser uma aluna diligente, quero fazer tudo «certo» — mas, desta vez, não se trata de notas. Trata-se de sinceridade.
E, através desta série de reflexões, espero levá-lo comigo, quer já tenha realizado o Hajj, sonhe com ele ou simplesmente queira compreendê-lo de uma perspetiva pessoal.
Comecemos por Arafat
Ouvirá os muçulmanos dizerem: «O Hajj é Arafat.» Mas o que significa isso?
Arafat é uma vasta planície nos arredores de Meca, onde, no 9.º dia de Dhul Hijjah, todos os peregrinos se reúnem em wuquf — permanecendo em pé em adoração. Do meio-dia ao pôr do sol, não fazemos nada além de ficar em pé e rezar. Não há rituais complicados. Não há cerimónias grandiosas. Apenas milhões de pessoas, silenciosamente ou em lágrimas, a falar com Deus.
Diz-se que foi aqui que o Profeta Adão (o primeiro ser humano) se reuniu com Hawwa (Eva) e onde as suas orações por perdão foram aceites. Naquele momento, a jornada da humanidade na Terra começou verdadeiramente — não com um castigo, mas com misericórdia.
É isso que Arafat simboliza: o início da vida humana marcado pelo arrependimento, humildade e perdão divino.
E é por isso que este dia é tão importante para todos os peregrinos.
Uma bagagem pesada: levando duas
Enquanto arrumava os meus lenços, sandálias e abayas (vestimentas largas que muitas mulheres usam durante o Hajj), também estou a levar algo muito mais precioso: duas — orações pessoais.
Mas, desta vez, não são apenas as minhas.
Nos últimos dias, amigos, vizinhos e parentes vieram visitar-me para se despedir antes da minha partida e para fazer algo bonito: confiar-me as suas orações. Eles sussurram os seus nomes, esperanças e dificuldades, pedindo que eu me lembre deles em Arafat.
É uma tradição silenciosa, mas um dos gestos mais profundos de fé e conexão que já testemunhei.
Eles pedem algo específico: «Por favor, não se esqueça do meu nome durante Arafat».
Para eles — e para mim — não é apenas um favor. É uma honra. E uma responsabilidade.
Enquanto escrevo isto, ainda faltam alguns dias para eu estar em Arafat. Mas já sinto a sua importância.
Porque quando estás lá, não estás apenas a representar a ti mesmo. Representas aqueles que amas, aqueles que perderam o rumo, aqueles que não podem fazer a viagem, mas cujas orações estão entrelaçadas nas tuas.
Arafat é um ensaio para aquele dia final que todos enfrentaremos — quando estivermos diante de Deus e prestarmos contas das nossas vidas.
Mas, ao contrário desse dia, este é cheio de esperança. Em Arafat, não há barreiras entre ti e o teu Criador. E Deus promete perdão àqueles que pedem sinceramente.
E então eu pedirei.
Por mim.
Pelos meus entes queridos.
Por todos os nomes sussurrados nas minhas mãos.